Entenda as consequências e os desdobramentos
políticos e econômicos da Primeira Guerra Mundial (1914-1918)
André Amano
11 de novembro de 2015
A Primeira
Guerra Mundial foi um conflito de grandes proporções. Envolveu as principais
potências capitalistas europeias e teve diversas consequências para o
desenrolar da história do século XX.
Para o
militar e teórico da guerra prussiano Carl Clausewitz (1780-1831), a guerra é
um ato político, com uso irrestrito da violência para impor a vontade de um
Estado sobre seu adversário. Dessa forma, a guerra seria uma extensão da
política, portanto, apenas o meio para se chegar a um fim.
Para Luciano
Cânfora, filólogo e historiador italiano, a guerra seria uma extensão da
política apenas para a classe dominante, enquanto para os trabalhadores haveria
uma suspensão da política, ou seja, dos direitos políticos.
De qualquer
forma, independente da interpretação, quando abordamos a Primeira Guerra
uma coisa podemos afirmar: sem dúvida, depois dela o mundo não foi mais o
mesmo.
A Segunda Revolução Industrial, ocorrida no fim do século XIX, acelerou o
desenvolvimento econômico dos países ricos da Europa. Como consequência,
acirrou a disputa pela hegemonia dos mercados compradores de produtos industrializados,
fornecedores de matérias-primas e importadores de capital.
O crescimento
econômico e industrial da Alemanha nas últimas décadas do século XIX fez com
que antigos rivais, França e Inglaterra, se juntassem para manter suas posições
de destaque no concerto europeu.
De acordo com
o historiador britânico Eric Hobsbawm, o período de 31 anos que vai do início
da Primeira Guerra (1914) até o fim da 2ª Guerra (1945) marca o arranjo
das forças do cenário mundial ao longo do século XX. Esses anos são primordiais
para a consolidação das formações econômicas e sociais e das ideologias de todo
o século.
Entre os
desdobramentos mais importantes da 1ª Guerra está a Revolução Russa e, por
consequência, o socialismo como contraposição ao capitalismo; a ascensão da
ultradireita, nazistas e fascistas; e a supremacia dos EUA.
A Revolução
de Outubro de 1917 é filha da 1ª Grande Guerra. A crise instalada nos países
diretamente participantes do conflito é um fator a ser considerado nesse
processo. O preço da guerra é pago sempre pela população mais pobre. Grandes
contingentes de pessoas, em geral das mais baixas estratificações, são lançados
à morte.
Além disso, a
mobilização das forças produtivas é quase inteiramente voltada para o conflito,
ou seja, para o complexo industrial-militar. Isso leva a população que não vai
ao front a uma situação de vulnerabilidade, principalmente por causa da escassez
de produtos básicos.
A ideologia
do socialismo e os partidos de massa da classe trabalhadora vinham em um
ascenso desde fins do século XIX. A 2ª Revolução Industrial havia piorado a
situação dos operários, à mercê de condições desumanas de trabalho e salários.
Foi a partir dessa época que surgiram os sindicatos.
Vários
militantes e teóricos se destacaram na formulação de ideias que almejavam uma
nova sociedade. O principal deles foi Karl Marx, influenciador direto da
Revolução Russa de 1917 e cuja teoria inspira movimentos sociais até hoje.
Embora a
Rússia não fosse um país industrializado e a maioria da população, camponesa,
seus líderes mais importantes beberam nas fontes da teoria operária. A situação
da população já era precária em razão do czarismo e piorou sensivelmente quando
o país entrou na guerra.
Assim, o
movimento socialista, que havia mostrado suas forças em 1905, ganha espaço e
derruba o czar em fevereiro de 1917. O povo saiu às ruas para pedir pão. Os
operários exigiam menores jornadas de trabalho e melhores salários, além da
saída da Rússia da guerra. Em outubro do mesmo ano, há uma revolução dentro da
revolução, e os bolcheviques tomam o poder, instaurando, finalmente o
socialismo.
Após o fim da
1ª Guerra, a Alemanha estava destruída: quase 5 milhões de mortos. O Tratado de
Versalhes fez com que perdessem todas as suas colônias, seu território foi
diminuído e ainda teve de pagar uma imensa indenização de guerra. A crise
econômica espalhou-se por toda a Europa.
A queda da
produção industrial e, por consequência, das exportações atingiram todas as
economias. O desemprego chegou a níveis elevadíssimos e as condições de vida
dos trabalhadores decaíram acintosamente. A Alemanha conheceu a hiperinflação.
Versalhes foi humilhante, pois, além de oneroso, feriu a autonomia do país com
várias restrições.
No cenário
internacional, o movimento operário comunista crescia desde o fim do século
XIX, e após a Revolução Russa, a primeira experiência socialista vitoriosa, o
movimento ascendeu e se espalhou por toda a Europa.
Se somarmos
todos esses elementos – a crise econômica, o anticomunismo e o nacionalismo,
resultado também das humilhações sofridas pela Itália e Alemanha –, teremos os
principais ingredientes que abriram caminho para os movimentos nazifascistas na
Europa.
Embora a
crise econômica que afetou principalmente as camadas mais pobres da população
tenha engrossado as fileiras dos movimentos comunistas, grande parte dos
trabalhadores aderiu à ultradireita.
Mas, se por
um lado, o nazifascismo combatia ferrenhamente o comunismo, outro traço
marcante de todos esses regimes era o seu caráter conservador, de extremo
nacionalismo e contrário ao estado liberal-democrático que reinava em boa parte
da Europa Ocidental. E é justamente essa dupla recusa que proporcionou a
aliança entre as potências capitalistas e a União Soviética na Segunda Guerra.
Para se ter
ideia, só na década de 1920 e 1930 temos os regimes de Benito Mussolini, na
Itália (1922); António Oliveira Salazar, em Portugal (1928); Adolf Hitler, na
Alemanha (1933); Francisco Franco, na Espanha (1936); Horthy, na Hungria
(1919); Pilsudski, na Polônia (1926). No Brasil, os fascistas nunca chegaram ao
poder, mas criaram o partido Ação Integralista Brasileira (AIB).
A Europa
ficou devastada após a guerra. Porém, os EUA não tiveram o seu território
afetado. O país vinha tornando se uma das grandes potências, mas ainda
esbarrava no poderio político e econômico dos países europeus.
O conflito
terminou de consolidar sua supremacia. Durante a guerra, foram os únicos a
manter, além da indústria bélica, outros setores industriais. Por isso,
abasteceram grande parte dos países envolvidos no conflito.
Ademais, os
EUA foram os que menos sofreram com a crise econômica do pós-guerra. Pelo
contrário, a sua economia foi beneficiada nesse momento. Os estadunidenses
passaram a ser não apenas os maiores produtores e exportadores de mercadorias
industrializadas, mas os maiores credores do mundo – além das dívidas feitas
durante o conflito, eles financiaram a reconstrução da Europa.
Os bancos dos
EUA haviam emprestado dinheiro principalmente para a França e a Inglaterra, que
ao receberem a indenização paga pela Alemanha a repassaram quase que
integralmente aos banqueiros estadunidenses.
Assim, após a
Primeira Guerra, temos uma nova ordem mundial com novos atores em disputa.
Assiste-se a uma reconfiguração geográfica e, também, a uma reconfiguração
política e econômica. Mas as disputas imperialistas que levaram ao conflito não
se enceraram em 1918.
Somando-se
isso à humilhação imputada aos derrotados, sobretudo à Alemanha, vemos eclodir
21 anos depois a 2ª Guerra, que encerrou o período que Hobsbawm chamou de “a
era da guerra total”.
A crença
absoluta na razão e no progresso ilimitado, que fomentou a Primeira Guerra
Mundial, mas também foi abalada por ela, só seria colocada em xeque
definitivamente no fim desse período.
* André Amano é historiador, pós-graduando do Programa de História
Econômica da USP
Saiba Mais
Era dos Extremos: O breve século XX, 1914-1991. HOBSBAWM, Eric. São Paulo: Companhia
das Letras, 2012.
O Longo Século XX: Dinheiro, poder e as origens de nosso tempo. ARRIGHI, Giovanni.
RJ: Contraponto/SP: Unesp, 2009.
A Anatomia do Fascismo. PAXTON, Robert. São Paulo: Paz e Terra, 2007.
Filmes
O Triunfo da Vontade. Leni Riefenstahl, 1935. (Documentário de propaganda
do regime nazista).
O Grande
Ditador. Charles Chaplin, 1940. (Sátira sobre o regime nazista).
O Encouraçado
Potemkim. Serguei Eisenstein, 1925. (Reconta um dos episódios da Revolução
de 1905 na Rússia).
Extraído de: www.cartaeducacao.com.br/
Oi
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